sexta-feira, 27 de março de 2009

Primavera no Dentes


Primavera Nos Dentes
João Ricardo/João Apolinário


Quem tem consciência para ter coragem

Quem tem a força de saber que existe

E no centro da própria engrenagem

Inventa a contra-mola que resiste


Quem não vacila mesmo derrotado

Quem já perdido nunca desespera

E envolto em tempestade decepado

Entre os dentes segura a primavera

Hamlet - Em Luto pelo Pai - Shakespeare


RAINHA- Meu caro Hamlet, afasta essa dor tenebrosa e olha com olhar amigo o Rei da Dinamarca. Não fiques para sempre de pálpebras baixadas, procurando o pó do teu nobre pai. Sabes que é assim mesmo, que tudo que vive tem de morrer, e atravessa o mundo para a eternidade.


HAMLET-Sim, madama, é assim mesmo.


RAINHA-Então, por que para ti parece diferente?


HAMLET-Parece madama? Não, é diferente. Eu sei que não "parece". Não são apenas o meu manto negro, boa mãe, nem a roupa tradicional do luto pesado, nem os suspiros atormentados da respiração difícil, nem os rios a correr dos olhos, nem a aparência batida do rosto, e mais todos os modos, o humor, os sinais de tristeza, que possam denotar o que sinto realmente. São aparências, ações em que um homem pode fingir. Mas eu tenho dentro de mim aquilo que ultrapassa tudo o que é apenas ornamento e roupagem da dor.


REI-É belo e honroso em vós, Hamlet, esta sentida homenagem a vosso pai. Mas deveis saber que vosso pai perdeu um pai; e esse pai perdido perdera o seu, e que o sobrevivente, por algum tempo, como dever filial guardara o luto. Mas perseverar em obstinada tristeza é uma espécie de ímpia teimosia, dor sem virilidade, que demonstra revolta contra o céu, coração fraco, espírito impaciente, inteligência simples e inculta. Por que havemos de tomar tanto a peito, na nossa revolta pueril, aquilo que nós sabemos que tem de ser e é tão comum como uma das coisas mais vulgares aos sentidos? Qual! É uma ofensa ao céu, uma ofensa aos mortos, uma ofensa à natureza, um absurdo contra a razão, cujo tema comum é a morte dos pais, e que não se cansa de gritar, desde que houve o primeiro cadáver até o que acaba de morrer: "Tem de ser assim".
(Shakespeare)